«Família em pânico»

Recorde o drama família de António Queirós, concorrente da primeira edição da Casa dos Segredos

01 Fev 2018 | 18:37
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Nota: Texto originalmente publicado na edição 1233 da TV7 Dias (novembro 2010)

Em Pousada, na freguesia de Baião, o ritual da família de António David de Queirós – por aqui conhecido pelo segundo nome – alterou-se substancialmente com a entrada do filho da terra no reality show da TVI. Maria da Graça e David António, osprogenitores, tratam dos animais e, agora,quando podem, lá vão espreitando as peripécias do filho na televisão. Isto sem as tecnologias no canal 10 da Meo, pois o dia é passado inteirinho nos montes, com as vacas e os três cães que lhe fazem escolta e companhia.

Os netos e a filha, Ângela, também ajudam nas tarefas domésticas, pelo que a calma reina nesta aldeia. Melhor: reinava. Cerca de uma semana após a mudança de “Tonho” para a Venda do Pinheiro, o cenário alterou-se drasticamente. Alertados pelos vizinhos, os pais de António – por cá, David – descobriram que alguém quer roubar os oito vitelos de oito meses que a família possui e que estão quase prontos para o matadouro, com a devida recompensa em euros. Assustado e com medo que o investimento “vá por água abaixo”, é o pai quem, aos 70 anos, faz vigílias dentro de carro velho, junto do curral das vacas, num terreno descampado e sem qualquer protecção. A TV 7 Dias esteve em Baião e sentiu o medo nas palavras de Maria da Graça e da filha, a que se junta a neta, Sofia, que teme pelo avô.

 

“Durante tantos dias andaram aqui todos e agora, que precisávamos de contar isto, não aparecia ninguém. Querem roubar-nos o gado. Ele está seguro dentro da Casa e a gente, aqui, que se lixe”, desabafa Maria da Graça, de lágrimas nos olhos, sem saber o que fazer.

A única solução para esta investida dos larápios – “gente invejosa”, ouve-se na terra – foi recorrer ao patriarca da família, a quem a idade não impede de se virar contra quem tentar levar o seu sustento.

 “Tivemos de meter um carro velho lá em cima para o meu avô dormir, à noite”, conta Sofia que, a seguir, descreve o novo dia-a-dia do pai do popular “Tonho”. “Ele sai de manhã com o meu irmão, que o ajuda a dar de comer e de beber ao gado e, depois, segue para o monte com as vacas e só volta ao final do dia, por volta das 18.30. Depois, vem cá abaixo, janta e volta para cima”, conta, angustiada.

Para comprovarem a veracidade do que dizem, Sofia e Ângela prontificam-se a mostrar à nossa (sua) revista o local onde o pai de António dorme, em precárias condições e, sobretudo, numa perigosa falta de segurança, tapado por cobertores que mal o protegem do frio – e a odisseia pode prolongar-se mais dois meses e apanhar os rigores do Inverno por estas paragens!…

 

Guarda montada ao frio

 

O curral das vacas fica a alguns quilómetros da casa de António. Pelo caminho, mãe e filha dizem que esta já não é a primeira vez que tentam fazer mal ao pastor. “Ele é aventureiro e vai-se safando, o que causa inveja a muita gente. Uma vez, deitaram fogo a uma loja [n.r.: casa do campo onde se guardam animais e ferramentas] e mataram as ovelhas e os animais todos que lá estavam dentro. Morreu tudo queimado.” Só que tiveram azar, uma vez que esse espaço pertencia a um vizinho.

Porém, o azar chegou mesmo a bater à porta da família Queirós. Há anos, um incêndio florestal levou-lhes o palheiro, do qual só sobra a estrutura. Chegados ao local, Ângela aponta para o carro onde dorme o pai e para a estrada de terra batida que ali dá acesso. “Está a ver, é ali que os carros andam a rondar, à noite. Os cães dão logo sinal e eles não defesa do gado, até o filho voltar entram, mas se calha não estar aqui ninguém, levam-nos um bezerro… ou mesmo todos. Mas você, se estiver aqui quando o meu pai chegar com as vacas, fala com ele e conta-lhe tudo.”

E assim foi: ao final do dia, o septuagenário David ANTÓNIO desce da serra e guarda o gado. E não é preciso muito para que comece o desabafo. Encostado ao carro, que se transformou na sua nova casa… ao relento, diz: “Enquanto ele lá estiver na Casa, vou ficar aqui. Os cães fazem-me companhia e tenho um rádio para ir ouvindo as notícias. Só vou a casa para comer e tomar banho.” E se aparecer alguém, ele está lá para o que der e vier. “Ainda ontem, por volta das 02.00 H da madrugada, havia ali movimento em baixo. Mas os cães deram sinal e eles arrancaram”, aponta.

Dentro do carro, o velho rádio a pilhas está em cima de vários cobertores. Os dois bancos estão deitados para trás e é neste desconforto que o pai de António pernoita. P erguntamos-lhe se a Polícia já foi alertada, mas o pai do pastor do reality show da TVI não se contém. “Às vezes, parece que nem vale de nada”, resigna-se.

 

Enquanto isso, António tenta a sua sorte na Casa para construir o telheiro para as vacas. “Não sei onde ele o vai meter, mas se ganhar, manda fazê-lo logo que aqui chegar e, assim, as vacas já não ficam ao frio todo  Inverno”,conclui David, que lembra que o filho tem noção das dificuldades em que deixou a família. “Ele, outro dia, estava aborrecido. Ele sabe o que deixou cá fora e está preocupado”, diz. Já Maria da Graça tinha confirmado o mesmo, horas antes. No entanto, todos torcem pela vitória dele, no próximo réveillon.

 

A inveja e as… verdades

 

A progenitora não se ficou por aqui. Aborrecida com o que vai lendo sobre o filho, a matriarca do clã Queirós aproveita para clarificar que o filho não recebeu qualquer indemnização quando foi operado ao joelho errado e que ainda hoje não está curado. “Ele ainda foi à advogada, mas ela disse-lhe: ‘Oh, David, não metas o médico em tribunal, que eles ganham sempre!’”

A irmã reforça: “Ele não ganhou nada! É mentira o que disseram em Baião, que ele comprou a loja e a casa com esse dinheiro.” Segundo a família, tudo não passa de “inveja” pelofacto de “Tonho” se destacar dos restantes habitantes da aldeia e aparecer na TV. E o tratamento… fazia-o ele, segundo a sobrinha. “Ele dava as injecções a ele próprio, na barriga, na cama dele. Sofreu muito”, lembra Sofia, enquanto correm lágrimas no rosto de Maria da Graça, ao recordar a dor do filho. Uma cruz que ainda carrega. “Ele ainda tem dores. Era para ser operado, mas não quer, porque tem medo que corra mal.”

 

No entanto, nem tudo foram tristezas na visita da TV 7 Dias a Baião. Na vila, encontrámos Clara Alves, uma amiga de António que esteve presente em alguns dos momentos mais importantes da vida dele. É esta analista, de 30 anos, quem desvenda o mistério do célebre livro do pastor. “Ele escreveu mesmo um livro, por alturas do 10.º ano, e nas aulas nós ríamo-nos com ele. Os professores de Geografia e Psicologia deixavam-no ler uma ou duas páginas antes de a aula acabar.” O livro, manuscrito, falava de amor e foi escrito num caderno, durante o tempo que António passava no campo.

“Metia teorias de filosofia e ele inventava coisas e fazia as suas ladainhas. Coisas que ele até já disse dentro da Casa. Também tinha poemas, mas tinha coisas que não faziam muito nexo”, lembra Clara, uma das últimas pessoas com quem o pastor falou antes de entrar no reality show.

“Ele ligou-me quando já estava em Lisboa e disse-me que estava com o segurança ao pé e que não sabia se queria entrar na Casa. Eu disse-lhe que era melhor desligar, mas ele respondeu: ‘O senhor segurança não se importa.’” Já no programa, em directo, António denunciou a amizade com Clara e falou dela como testemunha de mais um dos muitos episódios da sua vida. Clara recorda- o: “Uma vez, estávamos no meio das aulas e ele lembrou-se que tinha de ir comprar ovelhas e saiu. Ele disse que eu podia comprovar isso e… sim, é verdade, eu estava lá (risos).”

A amiga fala ainda de “um rapaz feliz, que de burro não tem nada e que só não seguiu os estudos porque não quis, ou porque os pais talvez não tivessem hipóteses. Ele, quando estudava, trabalhava ao mesmo tempo nas bombas de gasolina”. E nem isso o impediu de ser bom aluno.

 

“Ele não acabou com uma média muito alta, mas era muito razoável”, conclui. Se a popularidade do “Tonho” for igualmente boa, o pai, o sr. David, só voltará a dormir em casa no início do ano que vem, daqui a dois meses. Entretanto, esperam- -no muitas noites de frio (e chuva), em Novembro e Dezembro, a guardar o gado que alguém tenta roubar.

 

Textos e fotos: Luís Correia EXCLUSIVO TV 7 DIAS
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